Policiais militares do 20° Batalhão conseguiram na manhã desta terça-feira (15), deter três indivíduos que realizavam furtos de fiação no bairro Bacacheri em Curitiba. O trio utilizava um veículo Peugeot, em que o motorista levava dois indivíduos em alguns pontos do bairro e realizar o furto. Dentro do carro abordado os policiais encontraram fiação que estava enterrada e foi furtada. Eles foram detidos e encaminhados para a Central de Flagrantes, porém já foram colocados em liberdade.
A decisão da juíza Fernanda Orsomarzo, da Comarca de Curitiba, de relaxar a prisão dos três criminosos presos em flagrante furtando fios de energia, reacendeu o debate sobre a aplicação do princípio da insignificância no Brasil e seus impactos no trabalho das forças de segurança. Os criminosos, que haviam sido detidos pela Polícia Militar com fios avaliados em R$ 100,00, foram soltos com base no argumento de que o valor do bem furtado era irrisório, não justificando a intervenção penal. A decisão gerou grande indignação entre os policiais envolvidos na operação, que veem seu trabalho sendo frustrado por decisões que, na prática, desestimulam o combate à criminalidade.
Esse tipo de decisão, que aplica o princípio da insignificância, argumenta que, para ser considerada criminosa, a conduta precisa causar uma lesão relevante ao bem jurídico protegido. No caso dos fios furtados, avaliados em apenas 7% de um salário mínimo, a juíza entendeu que o dano foi insignificante e, portanto, insuficiente para a continuidade da prisão. No entanto, para os policiais que arriscam suas vidas diariamente, esse entendimento vai na contramão dos esforços para garantir a segurança pública e passa uma mensagem de impunidade.
A indignação não se dá apenas pelo caso em si, mas pelo que ele representa em um cenário mais amplo. Esse tipo de decisão, embora amparado por uma visão técnica do direito penal, tem consequências devastadoras na percepção da sociedade e, principalmente, no cotidiano dos policiais. Para os agentes de segurança, a sensação é de que o sistema judicial não valoriza o trabalho que eles realizam, frustrando suas ações e incentivando a reincidência. Afinal, se criminosos que são pegos em flagrante são soltos poucas horas depois, sem nenhuma penalidade relevante, o que os impediria de voltar a cometer os mesmos delitos?
O princípio da insignificância, embora justificado em certos casos para evitar a banalização do direito penal, vem sendo aplicado de forma cada vez mais ampla. O objetivo, em tese, é evitar que o sistema de justiça se ocupe de “ninharias”, concentrando-se em crimes de maior gravidade. No entanto, essa aplicação muitas vezes não leva em conta o contexto geral da criminalidade, onde pequenos furtos, como o de fios, fazem parte de uma rede maior de atividades ilícitas que afetam diretamente a vida das pessoas e a segurança das comunidades.
Furtos de fios de energia, por exemplo, têm um impacto direto na infraestrutura urbana, afetando o fornecimento de energia, de comunicação, causando prejuízos para empresas e residências e, em alguns casos, comprometendo a segurança de serviços essenciais, como hospitais. Além disso, os danos muitas vezes são maiores do que o valor do objeto furtado. O custo para reparar os danos causados pelo furto de fios pode ser muito maior do que o valor dos cabos subtraídos, o que gera um impacto financeiro significativo para as vítimas, sem contar o transtorno causado pela interrupção de serviços básicos.
Para os policiais, que muitas vezes trabalham em condições de alta pressão, com recursos limitados, a sensação de impotência diante dessas decisões é angustiante. Eles relatam que, em muitos casos, criminosos já conhecidos são presos diversas vezes, mas logo retornam às ruas, sem sofrerem qualquer consequência legal significativa. Esse ciclo gera um sentimento de frustração não só para as forças de segurança, mas também para a população, que vê o sistema penal como ineficaz para conter a criminalidade.
A decisão de soltar os criminosos também levanta questões sobre a percepção da justiça pelos próprios infratores. Quando um criminoso é liberado por conta do valor “insignificante” do furto, a mensagem que se transmite é a de que pequenos crimes não são punidos, o que pode acabar incentivando ainda mais esse tipo de comportamento. A falta de uma punição efetiva leva à sensação de que esses delitos não têm consequências reais, estimulando a prática repetida de crimes considerados “menores”, mas que somados têm um efeito devastador para a sociedade.
Além disso, decisões como essa acabam desmoralizando o trabalho das forças policiais. A sensação é de que todo o esforço empenhado em capturar os criminosos acaba sendo em vão. O trabalho de investigação, prisão em flagrante e elaboração de relatórios é desprezado quando os infratores são libertados pouco tempo depois, muitas vezes sem sequer passarem por uma audiência de custódia. Os próprios policiais relatam que, ao verem o mesmo indivíduo sendo preso repetidas vezes, perdem a confiança no sistema de justiça e se sentem desvalorizados em sua função de proteger a sociedade.
Outro ponto que merece destaque é o impacto psicológico dessas decisões na tropa. A rotina de um policial já é, por si só, desgastante, com jornadas longas, confrontos com criminosos e a pressão constante de garantir a segurança pública. Quando esse trabalho é constantemente anulado por decisões que, aos olhos deles, promovem a impunidade, o desânimo toma conta. Isso pode resultar em menor motivação, maior rotatividade de policiais e até aumento de casos de estresse e problemas emocionais dentro da corporação.
Em suma, o princípio da insignificância, quando aplicado de maneira descontextualizada, pode se tornar um grave obstáculo para o combate à criminalidade. Embora tenha sua base jurídica bem fundamentada, é preciso repensar sua aplicação em casos como o furto de fios de energia, que embora tenha valor econômico baixo, causa prejuízos significativos à sociedade. Mais do que nunca, é necessário equilibrar a proteção dos direitos individuais com a garantia da segurança pública, de forma que os esforços das forças de segurança não sejam anulados por decisões que apenas incentivam a reincidência de crimes.
A população, especialmente a que vive em áreas mais vulneráveis, espera que o sistema de justiça seja um aliado na luta contra a criminalidade, e não uma barreira para o trabalho da polícia. Caso contrário, o ciclo de impunidade se perpetua, e quem sofre as consequências são os cidadãos honestos que, além de viverem com medo, pagam o preço dos danos causados pela criminalidade desenfreada.